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Assédio, o verdadeiro esporte nacional

  • Foto do escritor: Plínio Zuni
    Plínio Zuni
  • 19 de jun. de 2018
  • 2 min de leitura

Atualizado: 2 de jun. de 2020

Cenas da Copa: um grupo de homens, vestidos com camisas da seleção, cercam uma mulher russa, pulam e gritam : BUCETA RÓ-SA! BUCETA RÓ-SA! BUCETA RÓ-SA!

Assédio, o verdadeiro esporte nacional

O vídeo viralizou, a nação está horrorizada e até o Itamaraty e a OAB se pronunciaram sobre tão hedionda vergonha.

Me pergunto a razão do choque.

Essa não é uma cena excepcional. Todos nós já vimos isso milhares de vezes. Acontece no pátio da escola, no carnaval, trotes de faculdade, despedidas de solteiro, barzinhos e festas de família. Algumas vezes são variações mais sutis, outras mais evidentes, mas a mecânica é a mesma.

Qual a diferença entre aquele vídeo e um grupo de caras dentro de um carro gritando obscenidades pra uma mulher na rua? Entre aqueles assediadores e os bons cidadãos que viram o pescoço e assobiam, latem, uivam toda vez que passa uma mulher? Machos caçando na balada, na rua, no escritório, na porta da igreja? Me lembro de um torneio universitário em que, durante os jogos femininos, os homens da suposta elite intelectual do país gritavam: "pode perder, pode ganhar, eu quero é ver o peitinho balançar".

É uma cena cotidiana, se repete em todos os cantos do país. Mais do que isso, comportamentos desse tipo são um dos pilares da construção de masculinidade heteronormativa padrão. Um elemento de socialização, algo como um rito de passagem, aceitação no grupo, formação de laços entre caras, manos, brôus, questão de tradição, boys will be boys, enfim, uma brincadeirinha inocente — a tal da cultura do estupro. Por isso, imagino que os assediadores daquele vídeo devem ter se surpreendido com a reação geral, uma vez que não fizeram nada que não fariam — direta ou indiretamente — sem problemas em casa.

Entre o grupo de assediadores, estava Eduardo Nunes, um tenente da polícia militar que, no último Dia da Mulher, concedeu entrevista pra televisão sobre a política de prevenção ao assédio sexual na universidade em Santa Catarina. Outro dos agressores é Diego Valença Jatobá, um advogado e político filiado ao PSB, condenado por dever à ex-esposa R$ 37.561,83 de pensão alimentícia. Jatobá ficou famoso por ter postado na internet uma foto segurando um maço imenso de dólares enquanto dava calote na ex-esposa e no filho.

Não são personagens incomuns: nem o agente de segurança pública que ameaça a segurança das mulheres, nem o cretino que não paga pensão enquanto gasta fortunas curtindo com os amigos, muito menos o grupo de homens praticando o assédio sexual por esporte. Normal, cotidiano, banal.

Então por que o choque?

Claro que é ótimo que a sociedade brasileira se enoje ao ver demonstrações de misoginia, mas não me parece que foi o que aconteceu. Pensando na desproporção entre a repercussão desse vídeo e o modo como normalmente a nossa mídia e público costumam tratar casos locais de assédio, fica evidente que o problema é outro.

Afinal, tudo bem ser um machista escroto no próprio quintal, garotos são só garotos... Mas fazer malcriação na casa dos outros, na frente dos europeus, e ainda por cima vestindo o manto da seleção? Isso é inaceitável, uma vergonha, o que é que vão pensar da gente, assim não dá... Meninos maus!

A nação não pode tolerar tamanho desrespeito, despudor, barbárie, obscenidade, agressão, violação… contra a bandeira nacional.

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